E tudo a chuva levou - Na noite de 25 para 26 de Novembro de 1967, a queda de forte precipitação causou violentas inundações em toda a região de Lisboa. As consequências foram alarmantes. Rios e ribeiras transbordaram as margens e, na sua sinistra passagem, as águas arrastaram pessoas e tudo mais que apareceu pela frente. Calcula-se que resultaram da intempérie cerca de 700 mortos e milhares de desalojados. Entre as vítimas mortais constaram três jovens e valorosos bombeiros, facto quase sempre ignorado quando se aborda o tema das cheias de 1967. Referimo-nos a José Carlos Ramos Basílio, Cadete dos Bombeiros Voluntários de Alverca, e José Rosa Serra e José António Lourenço Venâncio, respectivamente, Aspirante e Cadete dos Bombeiros Voluntários de Bucelas, cujos corpos foram encontrados mais tarde.

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Fogachos 3: Gente aprumada

Memórias do Comandante Fernando Sá | Jornalista e Bombeiro Voluntário



Um simulacro de incêndio! Era das coisas mais espectaculares que se podia oferecer à população de Lisboa. Festa nacional que se organizasse, visita oficial de elemento preponderante estrangeiro à nossa cidade, o simulacro de incêndio era número obrigatório do programa de recepção. E porquê? Fama. Prestígio. Brio inexcedível, sempre a rodearem o comportamento, a existência, dos bombeiros portugueses.

Começou o prestígio e a fama há cem anos. E não mais parou. Viemos encontrá-los há 39 anos, quando nos alistámos como maqueiro, que para mais não dava a idade.

Sentimos logo essa fama. Os nossos superiores no-la fizeram-sentir, pelas suas falas, pela sua própria presença e compostura. Gente aprumada! Élite!

Estamos a recordar o Fernando Cardoso Boto. Figura imponente. Alto. Desempenado, de fartos bigodes brancos! Que figura, quando tomava o seu lugar de chefe de viatura, no pronto-socorro!

E o Dias da Silva. De voz e acção ainda com restos da Grande Guerra, nos campos das Flandres. Enérgico. Um caso sublime a comandar uma formatura.

O Carlos Otero e Salgado, que foi da fundação dos Bombeiros Voluntários de Lisboa, e tantos outros que viemos encontrar, já a tripular os pronto-socorros, mas que se tinham calejado no sacrifício - entusiástico - de puxar as bombas manuais.

E a maca rodada? Essa sim que nos passou pelas mãos. Uma maca coberta e com duas rodas. Quantas vezes palmilhámos com ela de Campo de Ourique ao Banco do Hospital de S. José? Ainda hoje a recordamos, quando tripulamos uma das modernas "Merdedes".

Tempos antigos. Páginas simples, mas de esforço e dedicação, para chegarmos aos tempos actuais.


Foto: Arquivo Nacional da Torre do Tombo
Demonstração de um novo pronto-socorro dos Bombeiros Voluntários de Campo de Ourique, na Rua Ferreira Borges, perante o então Presidente da República, Manuel Teixeira Lopes, em 24 de Junho de 1924