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16 de fevereiro de 2024

O INCÊNDIO NA AJUDA QUE ASSOLOU A FAMÍLIA REAL


Pesquisa/Texto: Redacção F&H

Vai fazer 50 anos que os socorros dos bombeiros - sapadores e voluntários - foram chamados para a Ajuda, na sua máxima força. Ardia o Palácio Nacional, vindo a perder-se a Galeria de Pintura de D. Luís I e parte da ala norte do monumento. Mas mais tempo faz ainda o incêndio que consumiu, no mesmo local, a Real Barraca ou Paço de Madeira, construída por D. José I, após o terramoto de 1755. Na ocasião, nem Nossa Senhora da Ajuda valeu à coroa portuguesa.



Na verdade, o edifício que albergava a residência oficial dos reis portugueses foi consumido pelo fogo, em razão de ser construído em madeira.

O recurso àquela matéria-prima deveu-se ao facto de o monarca ter ficado atormentado com as consequências do sismo que destruíra Lisboa e nunca mais querer habitar em palácios de pedra e cal.

Era, segundo Maria Isabel Braga Abecassis, na sua obra "A Real Barraca. A Residência na Ajuda dos Reis de Portugal após o Terramoto (1756-1794)","um enorme barracão de madeira tosco e desagradável".

O incêndio ocorreu a 10 de Novembro de 1794, já D. José I havia falecido. Reinava sua filha, D. Maria I.

A Gazeta de Lisboa, um dos primeiros periódicos existentes em Portugal, noticiou o acontecimento:

"Pegou o fogo por descuido em hum dos quartos baixos e lavrou com tal rapidez que, apesar das maiores diligencias, não foi possível impedir que ardesse toda a parte do Palacio que fica ao Nascente resultando daqui uma perda muito consideravel, sem embargo de se terem salvado muitos moveis. S. M. e as mais Pessoas Reais sahiram felizmente sans e salvas e se feriram nessa mesma noite para o Palacio de Queluz. Por ora não se sabe ao certo o número de individuos que perecerão no incendio, se bem que faltem 8 ou 9 dos soldados que acudirão".

Alertados pela tragédia, acorreram, lesta e solidariamente, ao sítio da Ajuda, frades da Boa Hora, das Necessidades e do Livramento, elementos do Exército sob as ordens do Duque de Lafões, fidalgos e funcionários públicos.

Por sinal, a Gazeta de Lisboa informa também que os frades atrás referidos tiveram um papel relevante no salvamento de vidas e bens preciosos.

Do ponto de vista da orgânica funcional, sabe-se que "as bombas apareceram rapidamente", revela Rocha Martins, jornalista e escritor, num artigo publicado no Diário de Notícias, aspecto que nos intriga, porquanto, aos procedimentos de localização dos incêndios, bem como de alarme e accionamento dos meios de combate, não presidia o princípio da resposta imediata. Vejamos a cadeia predominante, conforme imaginado pelo olisipógrafo Luís Pastor de Macedo, em "A Baixa Pombalina", livro de sua autoria:

"São dezasseis as badaladas que os sinos de uma torre de igreja acabaram de dar, badaladas que daqui a pouco e de espaço a espaço, serão repetidas pelos sinos das torres das outras igrejas circunvizinhas. Dezasseis badaladas? Não há dúvida o fogo é na freguesia de S. Nicolau. A Baixa movimenta-se. Os trabalhadores da Alfândega, do Terreiro do Trigo, dos cais e outros dirigem-se para as sedes das suas companhias que são nos locais onde trabalham e apresentam-se aos seus capatazes. Reunida a companhia - ou melhor, parte da companhia porque as faltas eram sempre muitíssimas - aí vem ela, correndo esfalfada, depois de se terem perdido pelo menos uns dez minutos, para a Ribeira das Naus, onde está o Capitão das Bombas. Aí se faz a distribuição dos utensílios para combater o incêndio - louça de barro e de madeira e alguns barris - e só então, depois de se terem perdido pelo menos mais outros dez minutos é que as companhias se dirigem para o local do fogo, não sem que primeiro tenham que ir ainda ao chafariz mais próximo encher de água o vasilhame de que eram portadores. Escusado será dizer que quando lá chegavam o fogo tinha alastrado como e por onde mais lhe conviera."


A luta contra o fogo e o impulso de Mateus da Costa

Nesse tempo, o Serviço de Incêndios de Lisboa totalizava 3 mil homens, envolvendo patrões de bombas, aguadeiros e companhias de serviço público.

O Senado da Câmara tinha criado, por edital de 13 de Agosto, o cargo de Inspector-Geral dos Incêndios, na sequência da fusão entre a administração dos chafarizes e a dos incêndios.

Mateus António da Costa, ex-Capitão das Bombas, fora nomeado para assumir a nova responsabilidade, ficando com jurisdição sobre os capatazes, cabos e aguadeiros.

Pese embora o contexto situacional, a Real Barraca ficou em condições inabitáveis, pela termodinâmica da combustão, salvando-se a parte ocidental do edifício e a livraria.

O Príncipe D. João VI, filho da Rainha D. Maria I, reconhecendo o esforço dos aguadeiros que trabalharam toda a noite gratificou-os com cem moedas.

Não existindo, tanto quanto julgamos saber, relatos circunstanciados ou gravuras alusivas à luta travada neste fogo, fazemos uma ideia do ambiente confuso gerado na ocasião, por força dos próprios condicionalismos da época, mormente a falta de autoridade de comando.

Aliás, sabe-se que uma das preocupações e prioridades de Mateus da Costa passou por disciplinar a articulação dos vários intervenientes nos incêndios, concentrada numa chefia única que dirigisse os trabalhos de extinção, o que lhe valeu, por vezes, entre outras ideias perfilhadas, alguns constrangimentos.

Porém, nada impediu que o nome do histórico inspector ficasse associado para sempre à adopção de medidas estruturantes e inovadoras, cujo grau de eficácia, muito notado pela sua rigidez, se fez sentir durante longo período de vigência e, sobremaneira, na obtenção de melhores resultados ao nível da prevenção e do combate aos fogos, numa cidade marcada por muitas desventuras.

Em 1796 principiou a construção do actual Palácio Nacional da Ajuda.